Como preparar os futuros profissionais para atuar num mundo em transformação e amplamente conectado, cujas fronteiras vão muito além do território nacional?
Para contribuir com este debate, o CAU/SP promoveu o Seminário Estadual de Ensino e Formação em Arquitetura e Urbanismo 2022—nos dias 30/11/ e 01/12 na capital, reunindo representantes do CAU/BR e de universidades brasileiras e estrangeiras, tendo por foco os desafios da internacionalização no ensino superior.
Os palestrantes convidados indicaram que as possíveis respostas envolvem questões complexas como acordos internacionais, o estabelecimento de equivalências curriculares e a redefinição de cargas horárias dos cursos de Arquitetura e Urbanismo brasileiros.
O professor Ronaldo Mota, membro titular da Academia Brasileira de Educação, destacou as transformações da tecnologia da informação neste século, que favorecem não somente o ensino e o trabalho remotos, mas também a própria natureza do exercício profissional, com ênfase no aspecto colaborativo. E apontou perspectivas positivas para os arquitetos brasileiros:
“Os profissionais brasileiros de TI [tecnologia da informação] estão atuando basicamente no exterior, e há uma enorme carência não suprida no mercado interno. Essa realidade pode acontecer com os profissionais de Arquitetura e Urbanismo? Claro que pode. Eu diria até que é inexorável que isso vá acontecer”.
Para isso é fundamental, diz Mota, que a educação superior foque na capacidade de aprendizagem dos seus estudantes: aprender a aprender continuamente é o grande desafio do século XXI.
Realizado presencialmente na sede do Conselho, com transmissão online, o Seminário Estadual de Ensino e Formação em Arquitetura e Urbanismo – SEEFAU 2022 foi uma iniciativa da Comissão de Ensino e Formação (CEF-CAU/SP).
Retrato do ensino
Somente no Estado de São Paulo há 204 cursos de Arquitetura e Urbanismo (modalidade presencial) autorizados pelo MEC neste ano, sendo 187 já em funcionamento. Na modalidade EaD (Ensino a Distância), já são 30 instituições autorizadas, sendo 23 em atividade.
São, portanto, 36.954 vagas autorizadas para cursos presenciais, e 50.384, para cursos EaD somente em SP.
“Este quadro vem se consolidando na última década, e nos preocupa muito no Conselho de Arquitetura e Urbanismo. Percebemos que algumas instituições não estão cuidando da formação de nossos profissionais da maneira adequada, como definido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais”, afirmou Ana Lúcia Cerávolo, Coordenadora da CEF-CAU/SP, que apresentou estes números na abertura do SEEFAU 2022.
Segundo Cerávolo, o Conselho tem se esforçado para se aproximar das instituições de ensino superior, oferecendo cursos e capacitações para docentes e estudantes, indo até as escolas em diversas oportunidades e produzindo material para acesso remoto.
Os desafios da mobilidade profissional
Para Valter Caldana Junior, Coordenador da CEF-CAU/BR e Representante das IES no CAU/BR, a possibilidade de mobilidade profissional – o exercício da Arquitetura e Urbanismo fora do território nacional—esbarra em dificuldades burocráticas e falta de reconhecimento da grade curricular dos cursos brasileiros.
“Quando nós falamos de internacionalização, estamos falando das nossas relações externas e, portanto, estamos falando de reciprocidades, e para haver reciprocidades, nós precisamos ter equivalências. Hoje, temos um problema sério de equivalências e isto tem dificultado as nossas relações externas tanto na formação quanto no exercício profissional”, sintetizou.
A baixa carga horária dos cursos brasileiros, 3.600 horas, não é a única, mas uma grande dificuldade para o reconhecimento dos arquitetos e urbanistas no exterior.
Caldana relatou que Portugal recentemente endureceu as exigências para os profissionais brasileiros por pressão da União Europeia, já que o país ibérico é uma ‘porta de entrada’ para o mercado europeu.
As novas fronteiras de trabalho
Cláudia Sales de Alcântara, Coordenadora Adjunta CEF-CAU/BR, fez a defesa da exploração de novos países e continentes para a atuação do profissional, indicando os países africanos falantes da língua portuguesa como um caminho próspero.
Entre os pontos de atração destes mercados, como os aspectos culturais e econômicos próximos, a Coordenadora destacou que vários destes países passam um processo importante de transformação do espaço urbano: “[eles] estão reconstruindo suas cidades, muitas vezes sem a devida proteção do patrimônio”.
Ricardo Soares Mascarello, Conselheiro Federal pelo CAU/SE e integrante da CEF-CAU/BR, apontou obstáculos para a internacionalização do ensino e a mobilidade profissional. Ele comentou que, além da baixa carga horária dos cursos no Brasil em relação aos cursos equivalentes no exterior, há outras fragilidades, como a estrutura curricular, uma vez que nem mesmo os países vizinhos do Brasil a reconhecem.
A experiência no exterior
A organização do evento também convidou três arquitetos e urbanistas para compartilharem suas experiências acadêmicas no estrangeiro, levantando as dificuldades e possibilidades para os estudantes brasileiros.
Fabiano Lemes de Oliveira, Professor Associado de Urbanismo da universidade italiana Politecnico di Milano, afirmou que complementar sua formação no exterior enriqueceu sua capacidade de “olhar de volta para o Brasil”, observando as metodologias, os modos de pensar a cultural, e as possibilidades de se fazer Arquitetura e Urbanismo.
Cristina Merhtens, da Universidade de Massachusetts, salientou que, para trabalhar no exterior, é necessário ‘ter humildade’ e capacidade de inserção na realidade do local em que se quer atuar.
“Mais do que nunca, hoje tem mais possibilidades de entrada no mercado global, mas é preciso planejar e se preparar para atuar fora do país”, comentou.
Finalmente, a arquiteta argentina Martina Acosta fez um relato detalhado sobre a graduação e pós-graduação em sua instituição de ensino, a Universidade Nacional do Litoral em Santa Fé (Argentina), com suas exigências e formas de especialização, comparando com a pós-graduação brasileira, em que realizou seu mestrado.