
“Como todos nós sabemos, e sentimos, a pandemia trouxe uma série de alterações na dinâmica urbana (…) uma série de problemas que já existiam se agravaram, outros que não existiam, surgiram; o modo como as pessoas se movem na cidade,os motivos que levam a se mover na cidade, mudaram (…) a forma como as pessoas consomem mudou; a forma como elas trabalham mudou”.
A constatação do arquiteto e urbanista José Renato Melhem, coordenador da CTMU-CAU/SP, abriu os trabalhos do debate realizado na sexta-feira (20) à noite no auditório da FAU Mackenzie na região central de São Paulo (veja abaixo o registro integral em vídeo do evento).
A convite do CAU/SP, cinco especialistas do setor acadêmico, do setor privado e do poder público se debruçaram sobre os novos e velhos problemas da mobilidade urbana em busca de soluções.
Na ocasião, o Conselho também firmou um convênio com a Associação Nacional de Transporte Público (saiba mais no box abaixo).
O representante da FAU-Mackenzie (anfitriã do evento), o prof. José Augusto Fernandes Aly, afirmou, na abertura do debate, que a instituição deve lançar um curso de extensão na área de mobilidade. “Entendemos que é um conteúdo da maior relevância para um mundo melhor, mais sustentável”.
Transporte público, direito social
Para os palestrantes convidados, a pandemia da Covid-19 “escancarou” alguns problemas graves da mobilidade urbana nas cidades brasileiras.
Ao reduzir a demanda por ônibus e metrô, e a receita das empresas concessionárias, a crise sanitária ressaltou a importância dos subsídios para o modelo de financiamento do transporte público, hoje “brutalmente questionado”, como ponderou o consultor Sérgio Avelleda, Coordenador do Núcleo de Mobilidade Urbana do Laboratório Arq. Futuro de Cidades do Insper.
“Por que quem usa o transporte público é quem tem de pagar a conta?”, questiona.
Para Silvia Stuchi, pós-doutoranda em Sustentabilidade pela EACH-USP, e diretora- fundadora do Instituto Corrida Amiga, a pandemia também expôs os problemas das cidades brasileiras para garantir a segurança dos usuários da “mobilidade ativa” (os deslocamentos feitos a pé). E lembrou que uma das maiores causas de mortalidade entre as crianças de 05 a 14 anos são os acidentes de trânsito.
“Talvez a grande lição da pandemia seja que (…) neste nosso isolamento, justamente com o medo de usar estes espaços, nós descobrimos o valor que o espaço urbano tem para as pessoas”, comentou Roberta Kronka, arquiteta e urbanista e Professora Associada da FAUUSP.
A intervenção do Estado
Como tornar uma rua insegura e insalubre num ponto de convivência para uma comunidade? Como reduzir a mortandade dos motociclistas nas vias expressas das grandes cidades?
Os dois representantes do poder público convidados para o debate apresentaram projetos pilotos que tentam encontrar soluções para estes desafios agravados pela pandemia.
Em Diadema (Grande São Paulo), a Prefeitura fez uma intervenção urbanística na rua Alfenas no extremo norte da cidade, uma via importante para a comunidade local por servir de ligação para a única passarela sobre a Rodovia dos Imigrantes, mas sem condições de uso com segurança e conforto, e com problemas de pavimentação.
Entre outras medidas, o poder público instalou câmeras de segurança, e usou de recursos paisagísticos, redutores de velocidade e pinturas no solo para tornar a via mais amigável para o pedestre. “O [projeto] Rua da Gente é um programa de rua compartilhada”, afirmou Ronaldo Tonobohn, diretor de Trânsito da Secretaria de Mobilidade e Transportes.
Na capital, a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) lançou o projeto “Faixa Azul”, uma sinalização de segurança para as motocicletas na Avenida 23 de Maio, uma das mais movimentadas vias da capital, e que faz a ligação dos bairros da zona sul com o centro da cidade.
A pandemia estimulou o aumento das entregas por motocicleta. Em consequência, parte da população buscou tirar esta habilitação pela primeira vez para prestar este tipo de serviço.
Com o crescimento deste modal, a CET notou também o aumento do número de mortes e feridos. “Já está morrendo mais de um motociclista por dia”, afirmou Diretor Adjunto de Planejamento e Projetos da CET, Luiz Fernando Romano Devico,
A intenção do projeto piloto foi reduzir o conflito entre moto e automóvel, que é a principal causa dos acidentes, observou. Os primeiros resultados apontam para duas consequências positivas: a) a adesão voluntária da maioria dos motociclistas à nova faixa; b) a redução da velocidade média dos motociclistas na faixa azul. “Eles [os motociclistas] entram na faixa e se tranquilizam”, afirmou Devico.

Convênio com ANTP prevê parceria em estudos
Na sexta-feira, a presidente do CAU/SP, Catherine Otondo, e o superintendente da ANTP, Luiz Carlos Mantovani Néspoli, assinaram o acordo de cooperação técnica entre as duas instituições.
O objeto do acordo de cooperação é estabelecer uma parceria para a elaboração de estudos, eventos, pesquisas e projetos no âmbito da mobilidade urbana, transporte e trânsito nas suas relações com o desenvolvimento urbano sustentável.
Trata-se de contribuir de forma efetiva na construção da agenda de mobilidade, transporte e trânsito, de modo a dar subsídios técnicos para proposições legislativas. O plano de trabalho prevê, além da realização de oficinas e reuniões técnicas, a elaboração de um guia de mobilidade e urbanismo tático.
Publicado em 24/05/2022
Da Redação